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O debate sobre letalidade policial no Rio de Janeiro abordado pelo ponto de vista da polícia e demais forças de segurança teve espaço na audiência pública convocada pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, para debater o tema. Nesta audiência integrantes da Polícia Militar e especialistas em segurança pública, além de vítimas e moradores com alto índice de criminalidade defenderam a importância de o debate não desconsiderar o lado das forças de segurança e as dificuldades que enfrentam para o exercício de suas atividades.

Edson Fachin afirmou que o objetivo dos debates é viabilizar um plano institucional de atuação não só para o RJ, mas para o poder público de todo o país, de forma a mostrar que é possível se fazer segurança pública, sem violência.

Fachin é o relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, que discute a elaboração de um plano de redução da violência policial em operações nas comunidades do RJ.

Para o major Ivan Blaz, integrante da PM do Rio de Janeiro, é preciso considerar e diferenciar que existem operações policiais e policiamento atacado. “A grande quantidade de armas nas mãos de criminosos permite que essas ações sejam feitas. PMs são atacados por criminosos rotineiramente”, disse.

Armas de guerra entram com facilidade pelas fronteiras e chegam às comunidades, onde o crime assedia facilmente “uma juventude ociosa, em sua maioria composta por pessoas pretas e pardas”. Ele afirmou que o debate em torno da letalidade policial não pode ignorar a existência dessa realidade, para não desacreditar as forças de segurança diante da população, e que a PM deve ser um ente participativo na construção de uma nova forma de gerir a segurança pública.

Houve um aumento dessas operações a partir de outubro de 2020, em período já abrangido pela liminar do STF que restringe essas operações. As incursões emergenciais exigem a entrada da polícia nas comunidades, como a busca por vítimas de crimes que são levadas para dentro das favelas; denúncias pelo 190 de casos de violência doméstica, que aumentaram em 70% durante a pandemia e que são atendidos pela Patrulha Maria da Penha; e denúncias de próprios moradores de casos de tortura e morte dentro das comunidades.

Em 2020 foram 375 operações realizadas e em 2021 houve 160 incursões e que todas foram comunicadas ao Ministério Público no exato momento em que ocorreram. Quanto aos números, afirmou que há discrepância entre os dados apontados pelos pesquisadores e os do Instituto de Segurança Pública.

Em artigo, publicado na semana passada o Ministro e atual Presidente do STF, Luiz Fux, apresentou o caso de George Floyd dos Estados Unidos, que aos gritos; “Não consigo respirar”, dizia, enquanto o policial Derek Chauvin lhe pressionava o pescoço com seu joelho por mais de nove minutos. Os 12 jurados convergiram em veredito unânime, condenando o policial pela prática de homicídio.

Fux também comentou sobre as cenas lamentáveis circulando pelas redes sociais, revelando a brutalidade com que alguns policiais abordam transeuntes nas ruas, ou agridem populares que infringem regras sanitárias ou abrem o comércio irregularmente. Recente vídeo evidenciou indícios de excesso na abordagem de um policial que apartava uma briga entre vizinhos em Cambé, no Paraná. No episódio, um policial de porte atlético avantajado esbofeteou um cidadão na frente da esposa e dos filhos. Noutros vídeos, agentes abordam lojistas irregulares com a arma em punho e agridem mulheres com golpes típicos de lutas marciais, em atitudes sem precedentes de violação da dignidade humana.

Assim como o Ministro Fux, eu também entendo que não se discute a importância das forças policiais para a manutenção da ordem pública e social, para o cumprimento das leis e para a construção de um ambiente de institucionalidade no país. Também não há dúvidas de que as forças policiais são integradas por membros, em sua maioria, leais às suas missões e zelosos de seus deveres. No entanto casos de excesso na ação das polícias têm se tornado cada vez mais comuns.

A título de exemplo, o número de pessoas mortas por policiais militares em alguns estados cresceu mais de 20% no primeiro semestre de 2020 em comparação com o mesmo período de 2019, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Apesar da pandemia do novo coronavírus e da queda nos índices de crimes violentos, os dados mostram aumento de 6% nas mortes decorrentes de intervenção policial no primeiro semestre de 2020 na comparação com 2019.

Para o coronel da PM Carlos Alberto de Araújo Gomes Júnior afirmou que é temerário abordar o tema apenas pelo ponto de vista do controle externo, que não faz justiça ao esforço dos policiais que se arriscam diariamente.

Segundo Jayr Ribeiro Junior, da Associação de Praças da PM do Paraná, o aparato do Estado de forma rígida e opressora não é suficiente. “Precisamos da atuação efetiva por parte do Estado, ou seja, uma política social que possa proporcionar oportunidades para todos, com a garantia dos direitos fundamentais” disse.

Elias Miler da Silva, representante da associação Oficiais da PM de SP, fez questão de destacar a história de policiais que também são vítimas nas operações e afirmou que o principal problema do Brasil é a corrupção, “mãe de todos os outros crimes”. Ele destacou, ainda, os custos econômicos e sociais da criminalidade e afirmou que o Brasil é o primeiro país do mundo em mortes de policiais, com cerca de 500 por ano.

Eliene Maria Vieira, do Movimento mães de Manguinhos, que tiveram seus filhos vitimados pela letalidade policial e que participaram da audiência pública no STF, falou aos prantos: Por favor, nossos filhos se foram e não mais podem falar, estamos aqui, pedindo, sejam nossas vozes.

FONTE: STF/CNJ

D. Ribeiro, Advogado, Pós-graduado em Dir. Adm e Constitucional e Pós-graduando em Dir. Penal e Processo Penal, Palestrante e Articulista.

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